Por Jorge Folena
O governo de Jair Bolsonaro não tem nenhum
apreço pelos mais vulneráveis do país e isto ficou claro desde seu discurso de
posse, em 1º
de janeiro de 2019, quando o ocupante da presidência manifestou que teria terminado
a era do politicamente correto.
Os povos indígenas sempre foram vistos como
inimigos por Bolsonaro e seus aliados. O presidente, valentão com os fracos (mas
bastante generoso com os muito ricos), sempre deixou manifesto o seu desejo de
expropriar as terras dos povos indígenas para servirem de pasto e para exploração
pelo agronegócio, para o garimpo de pedras preciosas e a mineração por empresas
estrangeiras.
Em 10 de maio de 2021 assistimos à selvageria
da invasão de terra dos ianomâmis na comunidade Palimiú, em Roraima, por
garimpeiro armados, que atiravam contra mulheres e crianças. São imagens chocantes,
confirmadas por agências de checagem de notícia, mas que no governo de
Bolsonaro se naturalizam, pois o presidente, com seu gesto de arma em punho, incentiva
a matança e a destruição de tudo que possa representar resistência e luta por
uma vida digna.
Enquanto os brasileiros se preocupam com a
pandemia da COVID-19, desde o final do ano passado a “boiada” vem passando, conforme
demonstram as notícias abaixo:
“Levantamento mostra avanço da mineração em
terras indígenas: Agência do governo autoriza 58 requerimentos minerários em
terras indígenas da Amazônia, algo proibido pela Constituição. Cenário é uma
ameaça real a regiões que deveriam ser protegidas” (DW, 26 de novembro de 2020)
“Terra indígena mais desmatada do Brasil tem
6º ano seguido de alta. (...) Cachoeira Seca,
no Pará, terra indígena mais desmatada do Brasil, tem uma taxa de perda de
floresta que cresce há seis anos. Os dados de desmatamento foram contabilizados
entre julho de 2019 e agosto de 2020” (Portal G1, em 01/12/2020).
A Constituição estabelece que “são
reconhecidos aos índios (...) os direitos originários sobre as terras que
tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer
respeitar todos os seus bens”. A Carta Constitucional esclarece que “são terras
tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter
permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar e as
necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e
tradições.” E afirma ainda que “as terras tradicionalmente ocupadas pelos
índios se destinam a sua posse permanente, cabendo usufruto exclusivo das suas
riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.”
O tema das terras indígenas passa
necessariamente por um dilema, que vem sendo debatido há séculos, que trata da diferenciação
entre posse (situação de fato/real) e propriedade (uma ficção/criação da
inteligência).
Com efeito, esse dilema pode ser constatado
na seguinte assertiva do ex-ministro Ayres de Britto, no julgamento da terra
indígena Raposa Serra do Sol, no Supremo Tribunal Federal: “os indígenas ocupam
uma terra e não um território”.
Na verdade, a afirmação do Ministro esconde o
temor de se reconhecer a possibilidade da constituição de um território
indígena livre e soberano, mesmo sabendo que o Estado colonial se impôs violentamente
sobre as terras dos povos originários, que foram expropriados; daí a afirmação
de um “constitucionalismo fraternal” (Ayres de Britto), que visa apenas
acomodar as coisas, negando a existência dessa tensão.
Na luta pela posse da terra, o próprio
Supremo Tribunal Federal reconheceu, explicitamente, a expulsão violenta e agravada
pelas práticas de crueldade exercidas contra os povos indígenas, como registrou
o ex-ministro Eros Grau, no julgamento da Ação Civil Originária número 312/BA:
“desde queimadas de malocas, destruição de roçados e castigos físicos à pressão
moral e psicológica”.
Nesse ponto, é importante ressaltar que, depois
do julgamento do caso Raposa Serra do Sol, no Supremo Tribunal Federal em 2009,
tem aumentado os assassinatos no campo, chegando os números em 2017 ao mesmo
patamar do ano de 2003, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra.
Assim, as atitudes debochadas e agressivas de
Jair Bolsonaro são um desrespeito à Constituição, que procurou assegurar aos
povos indígenas o direito de posse sobre suas terras ancestrais e preservou seu
direito de exploração para atender as suas necessidades fundamentais.
Território indígena não é lugar para
exploração econômica; muito menos deveria ser palco para assassinatos e massacres
promovidos por garimpeiros e grileiros de terra, como vemos defender sistematicamente
o atual governo, que desrespeita os povos indígenas, a floresta e o meio
ambiente.
O bolsonarismo alimenta-se da violência, do
medo e do terror e, inescrupulosamente, incentiva o assassinato das populações
das periferias pobres das cidades, dos trabalhadores do campo e dos povos que
vivem nas florestas. São essas as questões presentes no recente massacre no
Jacarezinho por forças policiais e na invasão da Comunidade Palimiú por
garimpeiros e grileiros.
A sociedade brasileira precisa reconhecer, de
forma clara, os interesses que embasam a política de desarmamento, defendida por
este governo tipicamente fascista, cujos integrantes atuam para incentivar a eliminação
de todos os que eles consideram indesejáveis, como os povos indígenas.
Assim, é necessário que a sociedade civil e
os movimentos populares se unam e se mobilizem contra essas ações do fascismo;
pois se hoje há os que dão de ombros e pensam que não integram nenhum dos
grupos perseguidos, seu silencio e sua omissão farão com que amanhã o “outro”
seja qualquer um.
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