La horde, de Max Ernst, 1927. |
A nosso
ver, a corrupção tem relação direta com os desvios praticados pelos integrantes
de uma sociedade com limites éticos fluidos; ela encontra seu espaço, por
exemplo, na busca do lucro a qualquer custo, que se constitui terreno fértil
para sua instalação. Ela viceja quando empresas propõem fazer negócios em troca
de facilidades, mas alcança também os cidadãos, quando se dispõem a pagar
qualquer valor para obter vantagens ilícitas de todo tipo, grandes ou pequenas,
declaradamente danosas ou enganosamente inocentes.
A
corrupção, ao contrário do que anunciam os comentaristas mal intencionados ou desinformados,
não é uma invenção deste ou daquele partido político nem deste ou daqueles governos
passados, que estiveram à frente da administração pública de qualquer esfera:
Federal, Estadual e ou Municipal.
Por
isso, em nossa opinião, o que a “operação lava a jato” deixa como herança é a necessidade
urgente de se fazer uma reforma política de verdade no Brasil. Isto porque,
como se anunciou recentemente, grande parte dos partidos políticos e seus afiliados
com mandatos eletivos estão envolvidos, direta ou indiretamente, na “lista da
Odebrecht”.
O dinheiro
repassado pelas empreiteiras e outras empresas, no sistema até então vigente do
financiamento privado de campanha eleitoral, tem permitido que políticos beneficiados
pelos sistemas de arrecadação em curso, uma vez eleitos passem a trabalhar de
forma a atender aos anseios dos seus financiadores de campanha, deixando de
lado os interesses dos eleitores e da sociedade.
Na
verdade, o sistema que consagra o
financiamento privado de campanhas constitui um maltrato à democracia, pois
somente o candidato com capacidade de arrecadar as maiores somas em dinheiro
tem chances de vencer a disputa eleitoral.
Os
outros cidadãos, que não têm recursos financeiros, dificilmente conseguem obter
êxito em suas campanhas eleitorais, cada vez mais caras e de menor duração.
Tudo
isto torna o processo político elitista e distante da realidade do povo, que
somente é chamado a votar, num arremedo de participação, mas que, findo o
pleito, é posteriormente expelido de tudo e impedido de participar efetivamente
da construção da vida política, que diz respeito à toda a sociedade.
Sendo
assim, o que mais se vê são políticos eleitos pelo povo, porém trabalhando
diretamente contra os interesses da população, sem prestar qualquer conta de
seu mandato aos eleitores.
Por
tal razão, a “operação lava a jata” deixa como herança para a sociedade mais do
que a prisão de alguns políticos ou a quebra das empresas de engenharia
acusadas de corrupção (com o consequente desmonte de toda a cadeia de trabalho
e produção que existia em torno delas): essa operação, com todas as suas
consequências, demonstra a premência de se revisar, de forma urgente e verdadeira,
o sistema político brasileiro, para que o nocivo sistema do financiamento
privado seja eliminado e substituído pelo financiamento público, para que todos
os candidatos tenham as mesmas oportunidades, de forma igualitária, conforme
pressupõe o princípio republicano.
Pois,
em sua conformação atual, vemos que a política institucional apequenou-se,
tornando-se lugar de gente rica, a defender interesses de sua casta; ou para
quem almeja apenas obter alguma vantagem, não importa se de natureza econômica,
religiosa ou corporativa.
A
política – como tenho afirmado em outras oportunidades – é o lugar de
luta, de ação e de reinvindicação de
direitos; não é lugar para omissão nem para postulados da moral e de supostos
bons costumes.
Talvez
o mal maior da política atual não seja a corrupção em si, mas a omissão da sociedade
em participar e lutar por seus direitos, aliada à sua inércia em exigir a
devida prestação de contas dos governantes e dos parlamentares.
A
sociedade, porém, também não pode deixar o seu destino nas mãos da burocracia
(seja a administrativa, a do Ministério Público ou a do Poder Judiciário), mas
deve enfrentar, sem receio, os seus problemas e impasses, da forma como fazemos
em casa diante do surgimento de qualquer problema.
Pois
é conversando e debatendo que se resolvem os problemas. Daí a necessidade de se
ocupar os espaços públicos como praças, ruas, escolas e universidades para se
debater os problemas da sociedade.
Porque,
na verdadeira política, é o povo que deve determinar o que seus mandatários precisam
fazer para a sociedade. Mas o que se constata é o processo inverso, em que os
mandatários (políticos com mandatos eletivos), de forma deturpada, dizem para a sociedade o que ela deve fazer.
Sendo
assim, estamos diante de um grave desvio da finalidade da política contemporânea,
que necessita ser corrigido pela própria sociedade, pois é esta que, com seus
acertos e desacertos, constitui as bases da democracia.
Gostei Jorge é p que vc sempre fala no grupo F&C.
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirO núcleo de toda essa situação realmente é o sistema político atual, gestado para perpetuar essa espécie danosa de relacionamento entre a coisa pública e interesses privados.
Urge uma real reforma política, ponto de partida para a legitimação de todas as outras reformas.
Muito bom! Como diz o ditado, o rico cada vez mais rico o pobre...
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