Pular para o conteúdo principal

RESPONSABILIZAÇÃO DA LAVA JATO

                                           Os pilares da sociedade,  George Grosz, 1926.

Por Jorge Folena

O atual Procurador Geral da República denunciou que a Lava jato de Curitiba tem em seus arquivos secretos mais informação que toda a sua Procuradoria e que mais de trinta mil brasileiros foram investigados, sem que se saiba como ocorreram essas apurações, que bisbilhotaram a vida das pessoas e ameaçam a sua privacidade e intimidade, que têm proteção de inviolabilidade constitucional.

A revelação do Procurador Geral da República deixou evidente o que muitos já sabiam: a Operação Lava jato é um órgão paralelo ao Estado, que atua por conta própria e sem prestar nenhuma satisfação aos seus superiores hierárquicos no Brasil.

A Constituição afirma que “o Ministério Público da União tem por chefe o Procurador Geral da República”; e diz ainda que “são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.” Ou seja, não existem dois Ministérios Públicos, uma vez que  se trata de instituição única e indivisível.

Porém, os membros da Lava jato querem transmitir à população a ideia de que são uma unidade autônoma e “limpa”, isenta das mazelas da corrupção e, de certa forma, utilizam isto para intimidar o seu chefe, com o apoio conferido pelos meios de comunicação social em busca de anunciantes.  

A independência funcional dos procuradores e/ou promotores de justiça não lhes retira a subordinação hierárquica nem o dever de prestar contas de suas atividades funcionais; sendo inaceitável que unidades da instituição tenham arquivos secretos, o que é inadmissível numa República democrática, que exige (acima de tudo) igualdade e transparência.

Nos tempos do regime ditatorial de 1964-1985, era comum os órgãos de repressão do Estado terem arquivos clandestinos, utilizados para extorquir e chantagear indivíduos; muitos dos quais desapareceram e foram assassinados por aparelhos estatais, como confirmado pela Comissão Nacional da Verdade.

A existência de arquivos secretos, em regimes de exceção, somente serviu para favorecer algumas pessoas que ocupavam cargos públicos repressivos e se beneficiaram e enriqueceram às custas do Estado.

Há pouco tempo a Lava jato tentou constituir, para si e seus interesses políticos particulares, um fundo privado de mais de dois bilhões de reais, formado com dinheiro público, decorrente de um absurdo acordo de leniência firmado pela Petrobras com acionistas minoritários americanos; o que foi impedido pela ação da anterior Procuradora Geral da República e pelo Supremo Tribunal Federal. Neste ponto, saliente-se que a Constituição veda aos membros do ministério público receberem, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas.

Além disso, procuradores que proferiram palestras e participaram de eventos realizados com patrocínio de bancos e empresas não agiram de conformidade com a ética que se espera dos integrantes da instituição, que se apresentam com um moralismo exagerado contra os demais cidadãos perseguidos pela operação.

A Constituição de 1988 veio para abolir com toda forma de segredo e impedir que órgãos estatais atuem de forma patrimonial, em benefício de seus titulares. Por isso, é inadmissível que existam registros ou bancos de dados secretos, mesmo que empregados para investigação criminal, uma vez que muitas informações pessoais (da vida privada ou intimidade) podem vir a ser utilizadas para intimidação ou chantagem.

Em razão disso, o Brasil não tolera mais a perseguição judicial e policial, promovida pela Operação lava jato contra os que lutam e defendem a soberania, o desenvolvimento social e um país mais justo e solidário para todos.

Prisões preventivas, na maioria das vezes desnecessárias e com total desrespeito ao princípio constitucional da presunção de inocência, continuam sendo utilizadas pela Lava jato como forma de espetáculo público de execração da personalidade de brasileiros e instrumento de tortura psicológica para obter indevidas delações.

O estado de exceção e o fascismo em curso no Brasil são consequências das medidas autoritárias e abusivas praticadas por integrantes da Lava jato, como manifestaram os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

Chegou a hora de darmos um basta ao autoritarismo promovido pela Operação lava jato, que nos lançou no caos político e econômico em que nos encontramos hoje, à mercê de um governo descomprometido com o país e seu povo; que possibilita a morte de cem mil brasileiros e a contaminação de três milhões de pessoas pela Covid-19.

Assim, diante de tanta destruição, o momento é de exigir transparência na condução da operação Lava jato e a dura responsabilização dos seus integrantes, que promovem a violação permanente do Estado Democrático de Direito e utilizam a estrutura repressiva do estado para fins particulares e promoção política e pessoal.

Muitos brasileiros já foram prejudicados, reputações foram destruídas e vidas foram perdidas, como as de Dona Marisa Leticia, perseguida por ser esposa do ex-presidente Lula da Silva, e de Luiz Carlos Cancellier de Olivo, Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, que se suicidou após ser injusta e indevidamente encarcerado em decorrência desta nefasta operação, que segue utilizando os mecanismos judiciais de repressão para tentar calar os que lutam pelo bem do Brasil.

 

 



[1] Advogado e cientista politico. Diretor do Instituto dos Advogados Brasileiros e da coordenação do Movimento SOS Brasil Soberano.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O povo precisa ouvir a voz do Presidente Lula

Por Jorge Folena   Começo  o artigo de hoje  pel o ensinamento  do fil ó sofo e professor italiano Dom en ico Losurdo ,  que ,   e m seu livro Contra- H istória do Liberalismo  d esnuda  o  regime  liberal que ,   com toda a sua  pretensão de comandar o  mundo , é c onst it uído por  graves contradições ;   pois   não é democrático nem respeita as liberdades fundamentais  e , desde a sua fundação, revelou -se   belicista,  exploratório , violento  e autoritário.  Digo isto porque o governo dos Estados Unidos da América , país que  vende para  os demais   a imagem de “ maior democracia do  glob o ” , sem autorização judicial ou acusação  formal,   impediu  recentemente  que Scott Ritter  (cidadão norte-americano e ex-integrante das forças armadas daquele país)  pudesse viajar para  participar d o  F órum  Econômico ...

O HOMEM QUE RASGOU A CONSTITUIÇÃO

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado  Por Jorge Folena   O TSE, num grande esforço interpretativo ,  em minha opinião , livrou o senador Moro da cassação do mandato  pel a acusação de abuso de poder econômico. Ele comemorou e  faz  planos  para  tentar se eleger governador pelo Paraná e ,  quem sabe ,  retomar  sua  candidat ura  à presidência da República, com o apoio da classe dominante brasileira.  Diante de ssa  vitória momentânea , precisamos  r elembr ar   as violações à ordem constitucional promovida s  pelo senador quando  no cargo de  juiz. O golpe contra a presidente Dilma Rousseff, em 2016, abriu no Brasil as portas para o fascismo declarado e descarado ,  cujos agentes  de  maior  apelo  são Jair Bolsonaro e S e rgio Moro; sendo  o  último mais perigoso  que o primeiro  para o povo brasileiro.  Moro, com suas roupas escuras e “a...

Superação do fascismo no Brasil

A nau dos loucos de H. Bosch Por Jorge Folena   Infelizmente, as instituições têm normalizado o fascismo no Brasil. E foi na esteira dessa normalização do que deveria ser inaceitável que, na semana passada circulou nas redes sociais (em 02/07/2024) um vídeo de treinamento de policiais militares de Minas Gerais, em que eles corriam pelas ruas cantando o refrão “cabra safado, petista maconheiro”. [1] O fato configura um absurdo atentatório à Constituição, pelo qual todos os envolvidos (facilmente identificáveis) deveriam ter sido imediatamente afastados das suas funções, inclusive sendo determinadas prisões disciplinares, e, em seguida, sendo processados administrativa e criminalmente.  Outro caso esdrúxulo foi o de um desembargador do Paraná, que em plena sessão de julgamento, não teve qualquer escrúpulo em derramar toda a sua misoginia, ao criticar o posicionamento de uma mulher (o caso analisado no tribunal era de uma menina de 12 anos, que requereu medida protetiva contra a ...